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LITERATURA PARA TODOS OS PALADARES



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POESIA IMPURA I






Do livro "Lírica impura I", a ser publicado pela Editora Federal de Santa Catarina, 2009.


ANIMA MUNDI


O mundo é o abismo da alma.

Antonin Artaud



III

Idêntico me dispo
visceral e devasso
no entreato do ser.

Artífice de um corpo
idêntico renasço
intacto do mundo
tão vasto
incógnito
onde me traço.



VI

Ágora. Onde me deito escuro
num mudo tremular de vozes.

Âncora. Onde me afundo brusco
num súbito mar em chamas.

Incerto
esse prelúdio de deitar-se.



XI

Nunca nada
teu canto cala.

Além o mundo
- sonho de teu duplo -
sustenta tua nula boca.

Nunca nada
teu grito sonha.



AMARE EX ANIMO


IV

Ama-me. Como se houvesse
um cais.
E o possível sonhar-te
em calmaria e mar.

Ama-me. Como se só houvesse
um mar
no ritmado contorno
do cais.

Ama-me. Como se só houvesse
o cais.



VIII

Quando tateias
o brilho intenso
do meu sexo
sabes que algo reluz
onde menos se espera.

Deixa para o depois
tua mínima quimera.

Agora põe apenas a falsa mesa
como se lógico fosse
a farsa de fartar-se
à luz de breves velas.



XIII

Construtor de mim
em ruínas me faço.



SINE SOLO DOMOS


III

Amanhece
antes que a rubra
armadilha do sonho
se faça em cinza.

Cicatriza
o tempo no tempo.
O espectro das horas
cegando
o espírito no avesso.

Adormece
antes que a luz
te esqueça.



V

Os mortos sabem bem pouco
dessa lenta desconstrução
a que chamamos vida.

Os mortos sabem a dor
incrustrada no tempo.
Memória exata
já esquecida
do esquecimento.

Os mortos sabem calar
a morte:
tecido errante.



VIA CRUCIS



VI

Todos meus dias serão teus
os dezembros de ontem
e todos os vastos
tardios abraços.

Tudo teu
meu corpo e cansaço
e o desejo da alma
de ser além
deste exíguo espaço.

Todos meus dias
serão teus
e tudo meu.



VII

Atados a ti
meu nome
minhas claras palavras
meu reluzente sexo.

Até o osso
tudo tatuado
na atadura extensa
que é teu corpo.

Atado inteiro entendes?

Não basta a mansa
geografia dos pretextos.

Me beija
te faz mais factível
do que teus nítidos traços.



XIII

Toma-me anônimo
como me queres
e na manhã seguinte
a música
teu único inocente espaço.

Mas a noite gemes
mudo e derradeiro
nos meus braços.
Sabes da boca e sexo
o úmido dilatado
de dentro.

Toma-me anônimo
como me queres
e na manhã seguinte
eu me desfaço.